O ANARQUISMO HISTÓRICO



 

O ANARQUISMO

Há 10 anos, nas jornadas de Junho de 2013, iniciadas pelo Movimento Passe Livre, nós poderíamos encontrar jovens vestidos como a Guy Fawkes, figurados como o inglês do séc. XVII que tentou incendiar o parlamento e assassinar o rei como método de transformação da sociedade. Eles representavam - assim como diversos membros das primeiras manifestações, a ideia de rechaça à democracia liberal.

A máscara de Guy Fawkes (1570-1606) acabou popularizada no HQ V de vingança (1988) que acabou virando filme em 2006. Guy Fawkes participa da chamada conspiração da pólvora, um projeto católico para assassinar o rei James I. Guy foi flagrado em 5 de novembro de 1605 antes de conseguir detonar 36 barris de pólvora no Parlamento inglês. Assim como seus companheiros, Fawkes foi julgado e condenado a morte por traição.

De maneira bem abrangente, o anarquismo representa os anseios naturais dos seres humanos, e essa tendência de criarem instituições de governo representariam uma aberração temporária. Aliás, a palavra Anarquismo tem origem no grego e significa “sem governo”. Na verdade, o anarquismo prega que o Estado é nocivo e desnecessário e que existem alternativas para uma organização voluntária. Para uma total libertação da sociedade é necessário destruir o capitalismo e as Igrejas. Os anarquistas são contra a participação nas eleições e nos parlamentos, pois consideram a Democracia liberal uma farsa, a ideologia do anarquismo nega qualquer organização no qual exista hierarquia.

No anarquismo, a sociedade é concebida como uma rede de relações voluntárias entre indivíduos livres e iguais, alcançando um equilíbrio natural entre liberdade e ordem que não é imposto, mas sim garantido pela cooperação voluntária. O objetivo é eliminar o Estado centralizado, o capitalismo e as instituições religiosas, a fim de permitir que a verdadeira natureza humana floresça e que as pessoas assumam responsabilidades voluntárias. Nessa visão, o futuro anarquista seria composto por pequenas comunidades descentralizadas, autogeridas e federadas, que poderiam experimentar livremente novas formas de organização social, evoluindo gradualmente conforme as necessidades e preferências locais.

O movimento ganha força na primeira metade do século XIX, porém, o anarquismo é um movimento amplo e complexo, e assim como hoje, os primeiros anarquistas diferiam em seus objetivos e métodos, porém, algumas características comuns os uniam. Um elemento comum a estes primeiros anarquistas é a sua oposição ao comunismo. Os anarquistas eram contra a ideia de ditadura do proletariado, pois para eles, a organização dos trabalhadores na luta revolucionária pela formação de uma sociedade anarquista deveria ser realizada de baixo para cima. A crítica ao comunismo também estava centrada na que esta última buscava igualar as pessoas, negando a individualidade e independência de cada um. Nós podemos citar a pensadora anarquista judia emigrada para os EUA, Emma Goldman (1869-1940), que fez diversas críticas aos bolcheviques e ao rumo dado por eles após a Revolução de 1917, para ela, a centralização estatal e o autoritarismo, paralisavam a iniciativa e o esforço individual.

O Anarquismo histórico, tem início na década de 1840, quando Proudhon começa a organizar as ideias do movimento. Em sua obra – O que é propriedade? Ele escreve que a política era a ciência da liberdade, que o governo de pessoas sobre outras pessoas é sempre uma forma de opressão, e que apenas através da anarquia que haveria a perfeição na união da ordem com a anarquia. Proudhon foi um personagem interessante do anarquismo, pois da mesma forma que ele afastava qualquer organização baseada em suas ideias, durante a primavera dos povos na França em 1848, ele confessava em seu diário que ele era um representante do povo e o único que tinha razão. Se aprofundarmos um pouco mais em torno da sua obra, perceberemos que ela é recheada de paradoxos e contradições, como a tomada de controle do processo de produção pelos proletários e a manutenção do mercado, e até mesmo sobre a sua posição de internacionalidade e ao mesmo tempo amor a pátria. Apesar disto, muitos consideram Proudhon o grande inspirador do movimento socialista francês quer perduraria até 1930.

O anarquismo não cessa após 1848, pelo contrário, espalha-se pelo mundo através da ideia da qual ele era um projeto internacional comum, apesar das respostas anarquistas a questões específicas de determinadas regiões. Nesse contexto, Mikhail Bakunin, um até então defensor do Czar russo, conhece Proudhon em 1844, este que foi um grande influenciador das suas estruturas de pensamento.

Mikhail Bakunin (1814-1876) era contrário a algumas ideias de Proudhon, como as relacionadas a propriedade privada e ao individualismo, mas era adepto a teoria de associação desenvolvida por Proudhon. Desafeto de Karl Marx, Bakunin criticava fortemente a ideia de ditadura do proletariado. Na sua ideia, o comunismo acabaria sendo despótico como qualquer outro regime. Ele defendia que uma futura organização da sociedade realizada de baixo para cima, através da livre associação. A partir de 1861 Bakunin passou a difundir o anarquismo em várias partes da Europa, principalmente nos estados italianos, fundando organizações que dariam origem ao movimento anarquista italiano.

Outros pensadores influenciaram movimentos anarquistas em diversas partes do globo. Um dos pensadores mais proeminentes foi Piotr Kropotkin (1842 – 1921). Kropotkin acreditava em uma sociedade baseada na cooperação voluntária, na igualdade e na ação direta. Ele via o Estado como uma instituição coercitiva e opressiva, defendendo sua abolição em favor de formas de organização social descentralizadas e autônomas. Kropotkin enfatizava a importância da solidariedade e da ajuda mútua como princípios fundamentais para a construção de uma sociedade anarquista. Uma das obras mais conhecidas de Kropotkin é "A Conquista do Pão", onde ele argumenta que a sociedade possui recursos suficientes para atender às necessidades de todos, desde que a produção e a distribuição sejam organizadas de maneira racional e coletiva. Ele defendia a ideia de comunas autogeridas, onde as pessoas poderiam tomar decisões de forma direta e participativa. Além disso, Kropotkin era um defensor do anarco-comunismo, visando uma sociedade sem classes, onde os meios de produção seriam propriedade comum e os bens seriam distribuídos de acordo com as necessidades individuais.

 Diversos anarquistas atuaram efetivamente na luta por melhores condições dos trabalhadores e nos movimentos nacionais que ocorreriam no século XIX e começo do século XX. As suas lutas de forma mais geral se concentravam em incentivar a luta dos trabalhadores contra a exploração capitalista, com greves, boicotes, comícios, passeadas, fundação de sindicatos, o que permitiu que sua difusão ocorresse sobretudo entre os trabalhadores pobres e urbanos. A circulação destas ideias anarquistas ocorria de formas bem variadas, até mesmo em piqueniques e festas. Porém, foi através de publicações que o movimento conseguia se difundir, como o livrinho anarquista Entre camponeses, diálogo sobre a anarquia, escrito pelo italiano Errico Malatesta (1853-1932). O mesmo vai escrever um programa Anarquista em 1903, onde ele diz que os anarquistas buscavam mudar radicalmente o mundo, substituindo o ódio pelo amor, a concorrência pela solidariedade, a busca exclusiva pelo bem-estar pela cooperação, e a opressão pela liberdade.

O movimento anarquista fará parte da primeira AIT (Associação Internacional dos Trabalhadores) em 1864, fundada por trabalhadores europeus e norte-americanos. Porém em 1869 com a entrada de Bakunin, anarquistas e comunistas entrariam em conflito e o movimento enfraqueceria após a expulsão de Bakunin em 1872. O movimento anarquista começaria a perder força nas décadas de 1920-1930 devido ao surgimento de partidos comunistas e o aumento da presença do Estado nas sociedades ocidentais, por isso, encerra-se neste momento o ciclo chamado de anarquismo histórico.

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