O conceito de Nacionalismo é
bastante ambíguo, ou seja, os diversos debates sobre o que é nacionalismo
tornam difícil delimitar um olhar único sobre este termo, por isso, nós vamos
abordar o nacionalismo a partir de pontos de vistas de autores consagrados que buscam
esta definição desde o século XIX.
Com Ernest Gellner o nacionalismo
é um elemento moderno, só possível através de sociedades industrializadas e de
uma língua comum. Para ele, a ideia de nação é uma expressão que ocorre quando
todos de uma mesma cultura fazem parte de uma mesma unidade política. Essa ideia
de nacionalismo como sendo uma cultura, um Estado, impossibilita que países
agrários possam ser considerados nacionais, pois a presença de diferentes
culturas e costumes impossibilitam a homogeneização.
Eric Hobsbawn aponta que ao
caracterizar uma nação, alguns pontos em comum sempre são levados em conta,
como a língua, etnia, território comum, cultura, etc. Porém, ele adverte que
esses próprios conceitos são ambíguos e mutáveis, e são usados muitas vezes como
elementos propagandísticos, por isso, a definição de uma nação não pode ser
feita apenas através deste olhar objetivo. Nesta linha, ele sugere que a nação,
de forma subjetiva, seja entendida como um grande grupo de pessoas se
considerem parte de uma nação. Para que uma nação seja criada, basta que haja
uma vontade compartilhada entre essas pessoas.
Com Benedict Anderson, nós temos
a ideia de que o conceito de nação parte do princípio de que o mesmo é uma
comunidade política imaginada, assim como a sua identidade nacional. Como é
impossível conhecer individualmente todos os membros de uma sociedade, as
características comuns que unem ou diferenciam estas comunidades, foram, em
algum momento, inventadas. A partir daí, temos que pensar em como essa
identidade nacional foi difundida para que tal Estado se identificasse como
Estado-Nação.
Essa ideia de nacionalismo existe
mesmo antes do seu conceito, porém, ela se fortalece a partir dos movimentos
iluministas e das Revoluções do Séc. XVIII. Estes movimentos enfraqueceram
regimes baseados na ordem divina, por exemplo. Nascia a ideia de que o poder
deve emanar da própria sociedade, por isso, nós temos o nascimento do conceito
de cidadania e de pertencimento a uma nação. Não podemos omitir que talvez o
próprio nacionalismo moderno tenha nascido no continente da América, a partir
de processos de independência distintos, como o dos EUA, do Haiti e também do
Brasil.
Se no começo do século XIX as
ideias nacionalistas se limitavam apenas aos intelectuais, a partir da segunda
metade esse debate se expande a outros grupos sociais, como os dos camponeses,
da nobreza e da burguesia. A omissão dos franceses em internacionalizar os
movimentos proletários durante a Primavera dos povos (em 1848) vai fortalecer os
movimentos nacionais por parte de muitos grupos proletários e camponeses, que
engrossariam as fileiras de países europeus, que utilizariam o nacionalismo
para legitimar um expansionismo territorial e comercial, ou seja, a rápida
ascensão do capitalismo vai motivar essas ações. A partir daí, alguns países
dominados, reagiam usando essas ideias nacionalistas para poderem lutar contra
países considerados invasores. Todos estes elementos fizeram com que o
nacionalismo se expandisse na Europa durante a segunda metade do séc. XIX. E dois
processos de unificação exemplificam esse nacionalismo, estamos falando do
processo de unificação italiano e alemão.
A Unificação italiana
Antes da unificação, a península
itálica tinha diversos Estados autônomos, com diferentes níveis econômicos. Havia
o Reino Lombardo-Veneziano, os ducados da Toscana, Lucca, Parma e Módena –
estes estavam submetidos ao Império da Áustria. Havia o Reino das Duas Sicílias,
que era um domínio da família francesa dos Bourbon, que empregavam um governo
absolutista, enquanto o Reino do Piemonte-Sardenha era autônomo e governado por
uma monarquia liberal da casa de Savoia. Já o papa comandava os Estados da Igreja
ou Estados Papais.
Os movimentos que discutiam a unificação
da Itália já existiam desde o fim das Guerras Napoleônicas, quando sociedades
secretas começam a se formar – uma delas é a do grupo dos Carbonários, formada
inicialmente por soldados desmobilizados das tropas napoleônicas que lutaram na
região. É deste grupo que surge Giuseppe
Mazzini, fundador do movimento paramilitar Jovem Itália, que tinha como
objetivo unificar a Itália através da educação e fundação de uma República
democrática. Um dos principais líderes deste movimento será Giuseppe Garibaldi,
é o mesmo que participaria da Guerra dos Farrapos – conhecendo a sua esposa,
Anita Garibaldi.
É durante a Primavera dos povos
que ocorre a primeira grande ação do movimento, como a fundação da República
Romana, liderada por Mazzini, o movimento expulsou o Papa e criou uma república
em 1848. Junto a este movimento, o Reino Lombardo-Veneziano rebelou-se contra o
Império da Áustria, recebendo apoio do Piemonte-Sardenha e das Duas Sicílias. A
intervenção da Áustria, França e Espanha provocou a derrota de ambos os
movimentos.
Em 1849 Victor Emanuel II assumia
o trono de Piemonte-Sardenha e herdava os conflitos contra a Áustria, nos quais
acabaria sendo derrotado militarmente em 1852. Porém, apesar das derrotas, a
população do seu reino aumentava devido ao surgimento de nacionalismo presente
na região, muito em parte do ressentimento dos italianos aos austríacos devido
a esta dominação. Ao nomear Camilo de Benso (conde de Cavour) como Primeiro-Ministro,
o mesmo procurou desenvolver o reino militarmente, economicamente e
diplomaticamente – apoiando ingleses e franceses na guerra da Crimeia. O conde
de Cavour era um representante a burguesia moderada e da nobreza fundiária –
desde 1847 ele liderava um movimento através do jornal de Turim – este movimento
se chamava Il Risorgimento – e buscava a unificação da Itália. Esta palavra
Risorgimento vai passar a dominar todo o processo de unificação italiana.
Apoiados por Napoleão III, o
reino de Piemonte vence os austríacos e 1859, anexando uma parte do reino
Lombardo, os ducados da Toscana, Parma e Módena, assim como parte dos territórios
da Igreja (Roma permanecia sob controle da Igreja). No ano seguinte, um
movimento de caráter popular e revolucionário – com amplo apoio de voluntários
camponeses – é cooptado por Garibaldi ficando conhecidos como “camisas
vermelhas”. Começava aí a “expedição dos mil” ou seja, uma campanha militar
contra o Reino das Duas Sicílias, que graças a experiência militar de Garibaldi
venceria um poder militar regular de 20mil homens. Apesar das grandes
diferenças de Garibaldi com a monarquia Piemontesa, o mesmo acaba cedendo o sul
da Itália a Cavour, sendo assim, em 1861 o Reino da Itália era formado,
passando a ser governado por Victor Emanuel II. Os camponeses do sul não tinham
força para articular uma oposição ao monarca, e os latifundiários da região eram
favoráveis a formação do Reino da Itália, pois esta unidade fortaleceria o
comércio da região com o restante da Europa. Garibaldi vai tentar tomar Roma
por diversas vezes, sendo derrotado pelos franceses. Assim como Veneza também não
fazia parte do Reino. Foi apenas com o apoio do Reino da Itália aos prussianos
que estes territórios puderam ser anexados à Itália em 1871. Com relação ao
domínio da Igreja em Roma, o papa Pio IX resistiu a essa imposição –
declarando-se um prisioneiro da Itália. Apenas em 1929 com o tratado de Latrão
os italianos cederiam o Vaticano aos católicos.
A atual Alemanha, assim como a Itália,
era formada por diversos Estados descentralizados, porém, apesar de certa
autonomia, estes Estados eram dominados pelo Reino da Prússia e da Áustria,
mesmo com o Congresso de Viena em 1815, estes Estados eram influenciados
diretamente por estes reinos.
A expansão capitalista na Europa fez
com que a Prússia instituísse uma união aduaneira entre os estados sob a sua
influência – Zollverein – com isso, as barreiras alfandegárias entre esses
países diminuíram impulsionando o comércio e a industrialização. Estes Estados
que se desenvolveram a partir do Zollverein – passaram a ver a unificação
como
uma ação positiva, pois acreditavam que isso fortaleceria seus produtos,
podendo competir no mercado internacional, até mesmo com os produtos do Império
Britânico. A Áustria, que não fazia parte do Zollverein, ficou isolada e perdeu
força política entre estes Estados Alemães, a Prússia passaria a ser a Grande
potência da região.
Em 1858 Guilherme I é coroado rei
da Prússia e o mesmo nomeia como primeiro-ministro o junker Otto Von Bismark,
este seria o principal responsável pela unificação alemã. Bismark era um antissocialista
e nacionalista, ele era contrário ao movimento de 1848, no qual o grupo de
populares sugeriu a coroa da Alemanha para o então rei da Prússia Frederico
(ele recusou dizendo que não queria uma coroa de barro). O projeto de Bismark
se concentrava em fortalecer o poderio militar e industrial da Prússia, que se
aproveitara da não-participação da Guerra da Crimeia para ascender diplomaticamente
no continente.
O projeto militarista de Bismark
era apoiado tanto pelos Junkers quanto pela alta burguesia, que via como
positiva toda essa expansão da Prússia. Aproveitando-se deste crescente poderio
militar, Bismark vai aproveitar a morte do rei da Dinamarca para acabar com o
domínio desta sobre estas regiões do norte, para isso, ele vai buscar a aliança
com a Áustria em 1864. Com a unificação da Itália e o conflito desta com a
Áustria em 1866, Bismark se aproveita para apoiar os italianos, forçando a
Áustria a declarar guerra à Prússia. A vitória prussiana sobre os austríacos
vai favorecer a organização da Confederação Germânica do Norte, liderada pela
Prússia. Essa confederação nomeou o rei prussiano como presidente hereditário a
partir da elaboração de uma nova constituição. Bismark vai convidar quatro Estados
do Sul a aderirem ao movimento a partir de um acordo militar secreto, caso os
franceses se opusessem à Confederação. Essa ação aumentou o sentimento de
nacionalismo na região.
Bismark aprendeu com o conflito contra
a Áustria que é uma vantagem provocar a declaração de guerra pela nação
adversária, pois fortaleceria o laço entre as nações aliadas. Desta forma, ele
vai provocar a França, principalmente ao apoiar a coroação de Leopoldo de Hohenzollern
após a derrubada de Isabel II em 1868. Leopoldo era da mesma família do rei
prussiano, e Napoleão III não poderia permitir ser cercado a partir destes dois
reinos. Após uma intensa troca de telegramas com Guilherme I, Napoleão III
recebia provocativas respostas (alteradas por Bismark). Ao declarar guerra à
Prússia, Napoleão III se viu sem o apoio dos Estados alemães que haviam feito o
acordo secreto e teve que enfrentar uma surpreendente velocidade de mobilização
dos prussianos, graças a suas alianças e a suas estradas de ferro. Os franceses
não conseguiram enfrentar o exército prussiano – muito devido as intensas
marchas forçadas devido a baixa velocidade de mobilização e organização. Desta
forma, Paris foi invadida e Napoleão III foi capturado pelos Prussianos, assim
como todo o exército francês em Sedan no dia 1º de setembro de 1870, os
franceses vão depor Napoleão III e declararem a Terceira República, em resposta,
os prussianos vão ocupar Paris até janeiro de 1871, e após o Tratado de Frankfurt
os franceses cederiam a região de Alsácia-Lorena comprometendo-se a pagar uma indenização.
Foi lá na sala dos espelhos do Palácio de Versalhes que os prussianos e os
demais príncipes alemães declaram Guilherme I como Kaiser da Alemanha e Bismarck
como chanceler do Segundo Reich Alemão.