A REVOLUÇÃO FRANCESA

 


Precedentes da Revolução

A Revolução Francesa é um processo de ampla luta social, motivada por uma crise econômica que escancarava uma sociedade estamental, cujo nascimento decidia o destino das pessoas. Ela (Revolução) foi um movimento irradiador, pois inspirou diversos movimentos com caráter emancipatório, sejam eles nacionalistas ou socialistas. As bandeiras com três listras, presentes em diversas nações do mundo, representam a grandeza da Revolução Francesa. Ela foi um movimento inspirado em ideias iluministas, maximizada pela classe burguesa e radicalizada pelos populares.

A França da década de 1780, estava cercada por uma grande dívida estatal, motivada pelos conflitos com a sua rival Inglaterra, potência ultramarina que ao contrário da França, conseguia superar o alto custo com as guerras a partir da sua Revolução Industrial. A França, cujo modelo político era muito diferente do inglês, este último dominado pela burguesa, carecia de ações econômicas que resolvessem o alto custo do Estado. O Estado francês era dominado por uma estrutura estamental, baseada numa monarquia absolutista, neste caso, chefiada pelo rei Luís XVI. A partir da figura do rei, o Estado francês se configurava em três estados distintos, onde 400 mil franceses pertenciam as classes mais privilegiadas, neste caso ao Alto Clero (1º estado) e a Nobreza (2º estado), o restante da população francesa, ou seja, por volta de 23 milhões de pessoas, estavam num grupo representado por deputados comuns, do 3º estado.

As safras ruins da década de 1780, mais especificamente em 1788-1789, aumentaram os problemas da sociedade francesa. A queda na produção do trigo promovia o aumento de preços e a fome das populações mais pobres. Mas não era a falta do trigo e a fome da população que incomodava o reinado de Luís XVI, era a crise econômica! Pressionado, o monarca convoca os Estados Gerais, um evento que não ocorria há quase 200 anos, e mostrava certa fragilidade do governo. A convocação dos estados gerais serviria para consolidar o aumento de impostos para o 3º estado. Porém, os representantes do 3º estado eram em grande maioria intelectuais inspirados pelo iluminismo, pertencentes a classe burguesa da França. Quando a votação do 1º e 2º estado indicavam o aumento para o 3º estado, estes protestaram por maior representatividade, sendo recebidos a portas fechadas no dia posterior. A reação destes membros do 3º estado foi se reunir numa quadra de Péla, assinando um pacto que criaria uma Assembleia Nacional e uma Guarda Nacional, passando esta assembleia a representar os interesses da França.


Antes de uma forte reação da nobreza e claro, da monarquia, os eventos do 14 de julho de 1789 serão decisivos para o rumo da Revolução. Ao invadirem a Bastilha, populares de Paris fortalecem o apoio a Assembleia Nacional, possibilitando a manutenção do movimento. A Bastilha era uma antiga prisão, utilizada para a prender os opositores do regime francês, e sua invasão, de certa maneira tornou-se um símbolo do final desta monarquia. Consequentemente em agosto daquele mesmo ano, os revolucionários elaborariam Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, um documento que explicitava a partir de ideais iluministas que previam a igualdade entre os homens e direitos naturais, entre outros como liberdade de expressão e a divisão do Estado em três poderes. Inspirada pela declaração, Olympe de Gouges, elaboraria uma declaração dos direitos da mulher, sendo completamente ignorada pelos homens do movimento, a iniciativa de Olympe foi uma das precursoras da luta feminista. 

Assembleia Constituinte (1789-1791)

A formação de uma Assembleia Constituinte trouxe diversas alterações para o regime de Luís XVI. O mesmo foi transferido de Versalhes para o palácio das Tulherias, ficando em Paris. Seu poder absolutista foi suprimido pelo parlamento, desta forma Luís XVI pertenceria a uma Monarquia Constitucional, perdendo a dianteira nas tomadas de decisões. Já a divisão estamental era abolida, desta maneira os direitos feudais dos nobres e privilégios de Igreja, como o dízimo e a não necessidade de pagar impostos, iriam terminar. Porém, esta assembleia iria frear os movimentos populares, proibindo, por exemplo, os sindicatos e impondo o voto censitário (voto masculino por renda). 




Neste período vão se destacar grupos políticos distintos na Assembleia. Os remanescentes da monarquia, que ainda eram uma maioria importante, representariam seus interesses políticos. Representando a pequena burguesia e grupos intelectuais, o Clube Jacobino era bastante heterogêneo, havia grupos de monarquistas como Antoine Barnave, o Marquês de La Fayette, Octave Mirabeau, Emmanuel Sieyès, Talleyrand; republicanos moderados, como Brissot, e democratas radicais (“roussonianos”) como os irmãos Robespierre. Os eventos posteriores vão transformar a configuração dos jacobinos. Por fim, ainda havia o grupo dos Cordeliers, liderados por Jean Jacques Danton, eles eram representados pelos mais humildes do subúrbio de Paris e até mulheres (de forma informal). Pregavam a vigilância sobre os deputados eleitos e sobre a Assembleia formada com a Revolução. Falando em humildes, do povo parisiense havia surgido o grupo dos Sans-culottes, nome denominado pelos aristocratas aos trabalhadores, pequenos proprietários e artesãos de Paris. Este grupo será um importante aliado dos Jacobinos nos anos posteriores.
Em julho de 1791 o rei Luís XVI tenta fugir da França e é apreendido em Varennes sendo posteriormente absolvido pela Assembleia, que o protege afirmando que ele havia sido sequestrado. O povo parisiense, ciente da fuga de diversos nobres e temeroso que uma coligação pudesse invadir a França recolocando o poder absoluto ao rei, protesta, querendo a cabeça do soberano. Em setembro a Constituição estaria pronta, o rei perderia na lei seu poder absoluto e haveria eleições, porém, através do voto censitário. A burguesia se acalmaria, porém, para a população em geral, nada havia mudado, inclusive a fome e a pressão financeira (pagamento de altos impostos) continuava. Naquele mesmo mês, as nações absolutas da Europa, anunciariam a sua Coligação para retomar o absolutismo na França. Com o país sendo ameaçado externamente, a população de Paris é armada e no lugar da Assembleia Nacional, a Comuna de Paris (governo local) assumiria o poder, aprisionando o rei. 



Convenção Nacional (1792-1795)


A ameaça das monarquias europeias radicalizam a Revolução. Em setembro de 1792 a Assembleia elege os membros da Convenção Nacional, que governaria entre setembro de 1792 até outubro de 1795. A partir desta eleição, uma ala mais radical do clube jacobino ganha espaço, com os rousseaunianos tomando conta do clube, nomes como Saint-Just, Marat e os irmãos Robespierre, seriam os maiores representantes dos jacobinos, que tinham apoio dos populares e do grupo dos sans-culottes, braço armado dos populares parisienses. Os monarquistas somem e um grupo da alta burguesia liderados por Brissot (que era comerciante da região da Gironda) aparece como antagonista dos jacobinos. Enquanto o clube dos girondinos sentava-se nas partes de baixo do salão, os jacobinos em grande maioria, ocupavam os assentos superiores, sendo conhecidos também como a Montanha. O grande grupo, porém, eram de deputados sem posicionamento fixo, sendo levados pelas proposições de ambos os grupos, estes ficavam sendo conhecidos como deputados de planície ou do pântano.


Em setembro de 1792 Maximilian Robespierre propõe a execução do rei Luís XVI como traidor. Ele foi acusado de enviar cartas para a monarquia austríaca, que tentava invadir a França e reconduzi-la ao absolutismo. Ao votarem nesta proposta, há uma divisão que nos identifica politicamente até hoje. Os jacobinos em sua maioria posicionaram-se ao lado esquerdo, para votarem pela execução, enquanto parte dos girondinos concentrou-se do lado esquerdo. Nascia daí a concepção política de Direita e Esquerda, apesar de não existir relação com as ideologias conflitantes atualmente. A oposição da Gironda em manter mobilização geral do povo francês em relação a guerra no exterior e também quanto a sua participação política – os girondinos temiam pela perda da sua propriedade privada – eles tiveram como resposta um levante popular, em parte liderado por Hérbert e seus partidários radicais. A partir daí a Convenção Nacional muda de configuração, são criados dois Comitês, o da Salvação Pública e o de Segurança Geral, estes comitês seriam dominados pela ala radical jacobina, pela Comuna de Paris e pelos Sans-culottes.

Para entendermos esta radicalidade, em setembro de 1792 a derrota francesa era tão iminente que os parisienses realizaram diversos assassinatos, este massacre atingia membros dos antigos estamentos, como os padres, alguns identificados como opositores da revolução e até mesmo presos comuns. No dia 20 daquele mês, tropas francesas resistem e vencem os prussianos em Valmy. O rei Luís XVI e a rainha Maria Antonieta foram condenados a execução, em janeiro o rei Luís XVI perderia a cabeça na guilhotina. A própria ação de guilhotinar o rei vai acentuar o movimento das monarquias absolutistas que buscavam abafar a revolução na França, a reação destas nações será a criação da Primeira Coligação contra o movimento francês, composto por monarquias como Áustria, Prússia, Holanda, Espanha, Sardenha e Inglaterra.



Numa França radicalizada pela ameaça exterior, o período entre 1793 e 1794, também chamado de República do Terror ou Ano II, vai ser marcado essencialmente pelo vigor do movimento jacobino, centralizado em lideranças como as de Robespierre e Saint-Just. É neste período que se tenta abolir expressões consideradas aristocráticas, como palavras religiosas e até mesmo o calendário, marcado pelas características do clima, por exemplo. A religião tem uma tentativa de substituição pela virtualidade, cujo ser-supremo era um substituto ao Deus cristão. Claro que essas tentativas foram superficiais, atingindo apenas a institucionalidade do regime, porém, outras ações necessitavam de uma urgência maior, e para mantê-las, a guilhotina teve que ser posta em prática. Acredita-se que entre 1793 e 1794, por volta de 35-40 mil pessoas tenham sido executadas pelo regime, um massacre, porém, muito abaixo do que os ingleses faziam com os irlandeses no período. Esta violência foi justificada pela necessidade de resistência militar aos invasores e também ao controle dos preços, já que o exército era pago através da dívida do governo, a moeda criada pelos jacobinos era controlada a força. Aumento de preços e especulações financeiras eram passíveis de condenações à guilhotina. O movimento jacobino vai perder força devido as vitórias militares francesas, que apaziguavam as tensões na capital, a corrupção de membros jacobinos no interior da França (que fortaleciam os opositores) e principalmente da tensão interna entre os jacobinos, membros da ala moderada como Danton (antigo líder dos jacobinos) e também da ala mais radical (como Hérbert que buscava aumentar o grau de radicalização) foram combatidos e guilhotinados por Robespierre e Saint-Just. No dia 9 do Termidor, em 1794, Robespierre e Saint-Just serão capturados e guilhotinados. Girondinos sobreviventes e opositores a ala de Robespierre, uniram-se e com o apoio popular ao fim do Terror, conseguiram golpear os jacobinos de Robespierre e retomar o poder. Os Sans-culottes e outros populares que apoiavam a esquerda de Hérbert, tinham sido desmobilizados pelo próprio Robespierre, quando este executou o líder radical jacobino. 



O retorno da ala burguesa ao poder leva a indagações sobre o porquê o movimento popular não conseguiu sustentar-se. Lembramos que a fala depreciativa deste período, é atribuída a partir do testemunho do inglês liberal Edmund Burke, que sustentou diversas interpretações nos quais relacionam o movimento jacobino a própria origem dos movimentos totalitários. Porém, Hobsbawn, por exemplo, demonstra que o número de assassinatos no período não é diferente do ocorrido nas demais monarquias ao redor, sendo muito inferior aos massacres que os ingleses empunhavam aos irlandeses neste período, e que o movimento jacobino, teve fim no seu próprio movimento, que não conseguiu transpor a sua radicalidade, primeiro pela classe popular não ter ainda construído uma identidade de classe e segundo por não existir na época, uma ideologia que pudesse fazer o movimento prosseguir. 

O ano III da República, ou seja, 1795, será marcado pela dissolução da constituição anterior e reconstrução doutra constituição, desta vez suprimindo o voto universal e recolocando o voto censitário. A burguesia retomava as arestas políticas da França, retirava o controle sobre os preços e acabava com as execuções da era jacobina. Um novo governo, dominado pela alta burguesia francesa assumia, era o Diretório, cujo governo executivo era composto por 5 membros, chamados de diretores. Este governo será marcado por instabilidade e intensas tentativas de golpes, tanto por monarquistas quanto pelos populares, descontentes com as perdas de direitos e políticas existentes na era jacobina. Ao contrário da política (visivelmente em crise) o exército francês passava por uma fase de vitórias contra a 1ª Coligação, conseguindo passar de uma fase defensiva, para uma fase ofensiva, com conquistas na Itália, por exemplo. A alta burguesia, observando que o exército era quem podia manter os negócios estáveis, vai permitir a articulação política que terminaria com o 18 de Brumário de 1799 (9 de novembro). Assim, o jovem e destacado general, Napoleão Bonaparte, vai assumir o governo junto a outros dois cônsules, porém, efetivamente seria Napoleão que governaria a partir do Consulado. Podemos delimitar esta data como o fim do processo revolucionário que havia começado em 1789, pois começaria a partir daí outra era, a Napoleônica.


 

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